Em primeiro lugar eu sou preconceituoso, mesmo praticando atividades físicas, nunca gostei de futebol. Pior ainda, acho tedioso assistir jogos televisionados ou torcer para um escudo, nunca entendi o frisson em torno dessa “paixão nacional”. Futebol, para mim, não passa de uma atividade boba e tediosa, rio quando ouço falar em futebol-arte: não meus caros, Picasso jamais faria umas embaixadinhas. Assim como os rappers americanos, muitos desses "atletas" intentam unicamente ganhar dinheiro e desfrutar a fama. Veículo de ascensão social para os pobres que querem comprar apartamentos caros e namorar com nádegas famosas.
Curiosamente, nunca ouvi falar de um jogador intelectual ou poeta, as denominações mais lisonjeiras para eles são apelidos do tipo "animal" ou “matador”. Tenho desânimo desses goleadores, gente que não pode ser levada a sério e que certamente não está em um pedestal. Mas, com uma dose de liberalismo clássico digo apenas que cada um encontre livremente o caminho que lhe faça feliz.
Agora, mesmo não sendo simpático a essa categoria, uma dúvida ressoa em minha cabeça. Esses chutadores de bola profissionais não podem praticar brincadeiras lúdico-sexuais? Não podem ir para um motel (barato ou de luxo) para fazerem sexo com mulheres, homens ou travestis? Não podem ter noitadas? Por quê? Porque a mídia os transformou em semideuses, envoltos em uma áurea de moralismo, totalmente desvinculados de um mundo real onde se encontra o sexo, as bebidas, as drogas e as transgressões. Mas, qual o mecanismo que subsidia esse pensamento conservador?
Um caso notário foi a divulgação de que o jogador Ronaldo “Fenômeno” (itálico e aspas são necessários) teria feito programa com uma travesti. A indiscrição da mídia se aguçou, jogador da seleção brasileira se submetendo aos seus torpes desejos? O fim... murmuraram os lugares-tenentes do chauvinismo. Seu nome virou sinônimo de pilhéria entre os humoristas locais, cujas habilidades de elaborarem piadas são limitadas às reciclagens dos desgastados motes homofóbicos.
Caso mais recente, o jogador André Santos (de quem até então eu sequer suspeitava de sua existência) teria participado de uma maratona sexual. Como jogadores não fazem sexo, iniciou-se sua imediata crucificação:
A passagem do lateral esquerdo André Santos, campeão da Série B, Paulista e Copa do Brasil pelo Corinthians, no futebol europeu poderá se encerrar mais rápido do que o imaginado. Embora tenha tido boas atuações pelo Fenerbahce, da Turquia, o ala da seleção brasileira acabou acusado pela imprensa do país de participar de "maratonas sexuais" em um hotel de Istambul, ao lado dos também brasileiros Vederson e Fabio Bilica, somado ao inglês Colin Kazin-Richards.
De acordo com o jornal alemão Bild, o quarteto deverá ser dispensado pelo técnico alemão Christoph Daum, chocado pelos acontecimentos, ainda em janeiro, quando se abrirá a janela de transferências de inverno no continente europeu. O comandante do Fenerbahce confirmou os rumores sobre os bacanais e mostrou-se decepcionado com a atitude dos atletas. fonte: (Ig Esporte)
Fico até imaginar o que seria uma maratona sexual. Os jogadores correm em volta da cama (aquecimento!) e depois pulam sobre suas companhias, obtendo como respostas gritinhos de prazer? Até o momento não entendi onde está o delito desses futebolistas. O que se esperava, uma maratona religiosa?
En nome do pá, du filho e du espíritu santuuuuu, que amanhã eu faça um gol. Amén.
Jogadores não podem fazer sexo. São exemplos para as criançinhas (sobretudo das classes mais humildes). Se elas conseguirem intuir que o prazer é positivo, que sua liberdade corporal não pode ser tolhida, uma importante amarra da opressão cotidiana se esfacelará.
A manipulação dos nossos desejos se constitui em invisível ferramenta de controle social. Modalidade de opressão que tão bem se institucionalizou na Igreja Católica, com uma atuação secular nessa área. Religiosidade anacrônica, pois as únicas catedrais que ainda guardam valor são os prédios dos grandes centros financeiros. Porém, o capitalismo flui melhor quando toda forma de prazer passa a se vincular ao mercado. Todo o desejo deve se converter, necessariamente, em um ato de compra. Caso as pessoas possam se satisfazer umas as outras, o espiral do consumismo pode perder parte do vigor.
Você é livre para comprar, não para amar e tampouco para gozar.
No caso desse atleta, há outros aspectos que devem ser computados, como a cor da pele, pois é notório que os jogadores negros sofrem flagrantes discriminações. Para a gironda, a imagem de um negro fazendo sexo é algo quase inumano, ultrajante. Há, inclusive, alguns trabalhos acadêmicos que mostram como a cobertura da imprensa a respeito dos futebolistas negros pauta-se por um racismo.
Jogadores devem ser exemplos para as gerações futuras. Por isso, suas aquisições materiais são valorizadas, podem comprar automóveis importados, apartamentos na beira-mar e se casarem com modelos loiras interesseiras. Não há problema em se transformarem em políticos, não obstante desconhecerem as noções mais elementares de bem comum, ou ainda, tudo bem se forem para programas televisivos ridículos arrotarem idiotices.
O que não se pode, em hipótese alguma é esses jogadores se reconheçam como seres humanos em busca da realização de desejos não materiais. As migalhas mínimas de liberdade que eles escarafuncharam devem ser pisoteadas. Não são tratados como humanos, mas como animais de exibição em um grande palco circense. Os altos salários recebidos fazem dos jogadores consumidores, mas não cidadãos.
Um mundo feito de donzelas em que a mídia esportiva é o cinto de castidade.
Bem, pelo menos você já anunciou desde o início que era preconceituoso. Tanto a compreensão do futebol quanto a da arte são muito limitadas e limitadoras. Concordo com sua crítica à hipervalorização do jogador, ao estardalhaço feito em torno desse esporte e, principalmente, quanto aos absurdos salários pagos a eles (como também sou contra os valores astronômicos de qualquer espécie em qualquer ramo, mas essas críticas tem uma pertinência muito maior do que a feita com base em um juízo supostamente estético.
ResponderExcluirMuito bom!
ResponderExcluirA hipocrisia não se resume nas atribuições deíficas dadas aos atletas, mas no comportamento do cidadão em relação ao jogo, jogador, ao clube... tenho que confessar que gosto de futebol, não sou um torcedor fanático, mas gosto de assistir aos jogos. Se bem que ultimamente não consigo mais diferenciar o que é um jogo de futebol e o que é uma transação monetária: um time vendendo resultado, outro de olho na imagem do clube, lavagem de dinheiro e outras coisinhas bem proxima da pequenes moral/intelectual dos "profissionais" da bola... a verdade é que nem sei mais quando um jogo é de verdade, ou apenas uma manipulação de resultados pra garantir a audiência...
Quanto ao racismo, este está tão impregnado na sociedade que nem dá pra se resumir ao futebol pra exemplifica-lo...
Parabens pelo blog...
Concordo com diversos dos comentários, apesar de perceber em diversos pontos como o sue preconceito inicial impede que entenda uma série de especifidades da forma como a prática futebolística é desenvolvida.
ResponderExcluirMas uma questão importante a se destacar é que o meio do futebol de alto nível, excessivamente explorado pela mídia, na verdade evidencia de maneiora exacerbada uma série de questões que estão presentes no nosso cotidiano. É uma versão hiperbólica do dia a dia. Tão intensa como é esse mercado e a vida dos que com ele se envolvem.
Sendo assim, o moralismo e o controle que você identifica, ainda que contornos específicos no meio esportivo, é, via de regra, o mesmo que povoa o nosso cotidiano.
Seguidamente somos pressionados a conduzir nossas vidas de modo a garantir a maior produtividade possível. Se você é alguém que trabalha no meio acadêmico é forçado a assumir todo uma postura e se policiar cotidianamente para garantir ou, ao menos, passar a impressão de que faz de tudo para conduzir da melhor maneira sua carreira e sua produção intelectual.
Não cabe a um intelectual se dedicar a atividades culturais rasteiras, a se dedicar à leitura de auto-ajuda (apesar de toda a depressão e solidão de que esses seres são vítimas), e por aí vai.
O mesmo se observa no mundo corporativo, no meio religioso.
Essa invasão da vida privada das pessoas em função do lugar na cadeia produtiva que ocupam é uma das facetas da chamada ditadura do trabalho.
Gostei do texto. Quando procurava por imagens da ascenção do futebol personificada na cultura "popular", como blocos de escolas de samba projetados para exaltar ou prestigiar clubes esportivos, encontrei uma fotografia instigante. Adriano, o "imperador", festejava ao lado de amigos sobre a laje de um barraco. Acompanhado de uma dessas dançarinas identificadas por apelidos tropicais, o jogador esbanjava alegria. Estava apenas curtindo, aproveitando um fim de semana ou um dia qualquer com amigos que provavelente há anos não via. Cerveja, possível churrasco, mulher. Não existe pecado entre os trópicos. Sob a tutela estrangeira o atleta sofria o impacto difamador das câmeras e jornalistas. Noites em boates prejudicias ao trabalho em campo. Garotas de programa, carros, etc., tudo o que configura uma personalidade sórdida, desviada. Julgaram o prazer alheio. No país das praias o imperador reina sob o sol das favelas e a habilidade com a bola transforma-se em potecia sexual. Subverteram a ordem dos valores.
ResponderExcluirfutebol é uma piada de "mau" gosto.
ResponderExcluirtalvez até mais "alienante" do que religião (em bh principalmente rsrsrs)
mesmo que um time não esteja "bem", a midia, em quase todos os formatos, solta declarações ufanistas - e não menos superfluas - e como passe de mágica, o povo instantaneamente volta a ser feliz com seu time do coraçao.
é mto raro, inclusive junto aos ditos "intelectuais" ver/ler uma critica sobre a merda chamada futebol: ferramenta de manipulação de massas, religiao, novela, calypso, etc etc etc etc
parabéns pelo blog,
voltarei por aqui sempre que possível.
se quiser ver/ler poesia visite-nos:
www.barkaca.blogspot.com
abraçao,
dioli